Desmistificando: Japoneses podem obrigar as editoras BR?

312

Eliminando mais um mito?

Existe um mito por aí de que as editoras japonesas obrigam as editoras brasileiras a trazer certo título ou a fazer de certo jeito. Isso é tudo conversa fiada para boi dormir. Porém isso não quer dizer que não haja exigências, mas todas as exigências são aceitas por livre e espontânea vontade pelas editoras brasileiras (sob pressão ou não).

Para entendermos um pouco mais do que acontece, vamos voltar um pouco e conversar em como uma editora brasileira adquire um título.

Ao contrário do que muitos acham, comprar licença é menos compra e mais aluguel. Você não vai em uma loja online exclusiva e sai colocando obras no seu carrinho. Licenças são adquiridas através de propostas e contratos, variando para cada empresa.

Em geral as editoras possuem empresas ou seções para lidar com licenciamentos e uso dos materiais. Você pode conferir que empresas são essas olhando os dados no mangá, geralmente em inglês. Alguns exemplos:

Alice Hearts: Portuguese Translation rights arranged through TOHAN CORPORATION, Tokyo.

No Game No Life: Portuguese translation rights reserved by NewPOP Editora Ltda-ME. under the license from KADOKAWA CORPORATION. through TOHAN CORPORATION, Ltd., Tokyo.

Samurai X: Portuguese Translation rights in Brazil arranged by Shueisha Inc. through Cloverway, Inc..

Trigun Maximum: Portuguese version published by Panini Brazil under license from Shonen Gahosha Co., Ltd., Tokyo through Tuttle-Mori Agency, Inc., Tokyo.

Não é incomum que os direitos sejam adquiridos também através de outras empresas americanas, como TokyoPOP e Viz. Um caso recente é Drug-On, da NewPOP, licenciado através da TokyoPOP.

Uma vez que você saiba quem possui aquela série, você pode mandar propostas e demonstrar interesse. Aqui é a hora em que as editoras mais quebram a cara, pois muitas vezes as editoras japonesas não põem muita fé em você ou não acham que está “no momento certo” de lançar aquilo. E se ela não quer te vender, ela não é obrigada. São as editoras brasileiras que têm que puxar saco, fazer propostas interessantes e vender os peixes delas.

Note que existe um enorme desbalanceamento de poderes aqui. A editora japonesa como detentora dos direitos possui a última palavra e, é por isso, que muitas vezes as editoras brasileiras não tem outra opção que não acatar os pedidos.

Veja que elas não são obrigadas, a editora BR pode dizer não e passar para outra. Mas se ela quer aquele título X, a editora japonesa pode ter exigências.

Uma das exigências mais comuns é o direito de veto e aprovação da capa. Os famosos atrasos devido “aprovação de capa” nada mais é que uma dessas exigências, nenhuma capa sai a não ser que eles deem o OK. Se algumas empresas são agradadas fácil, outras podem cismar com cada detalhe minúsculo.

Outras exigências são quanto a nomes, títulos, formato, etc. Tudo a depender da chatice de quem está do outro lado. Existem exigências vindas também dos autores, como as supostas vendas combinadas “Só deixo lançar 20th Century Boys se lançar Monster”, dentre outros detalhes que possam aparece durante as negociações.

Essas negociações podem ser rápidas ou levar uma eternidade. Há sempre o perigo de haver concorrência e as empresas japonesas passarem a aceitar negociar com aquela que mais lhe agradarem ou com a qual tiverem mais familiaridade. Pior, há a chance de entrar em leilão e passar a ser um “quem dá mais”.

Não é incomum também que as concorrentes tentem licenciar várias séries ao mesmo tempo, seja para conseguir vantagem sobre as outras, por facilidade ou a procura de algum tipo de desconto.

Seja como for, por causa da posição desvantajosa das editoras brasileiras em relação às licenciantes, não é incomum que elas sejam “forçadas” a acatar muita coisa para conseguir aqueles direitos. Mas no final das contas é uma escolha também da editora brasileira aceitar tais exigências.

Diga-se de passagem, isso vale também para quaisquer editoras estrangeiras e qualquer tipo de licenciamento. São todos contratos.


Desmistificando é uma coluna semanal, lançada nas quintas-feiras, sobre o mercado e mangás brasileiros e internacionais. Você pode ver todas as outras postagens anteriores desta coluna aqui. Sugestões e comentários também são sempre bem-vindos! 🙂

23 Comments

  • Bruno

    outra sugestão:

    fazer antologias com histórias nacionais como fazem no japão, daria certo aqui no Brasil?

  • Roses, uma sugestão de um mito que tenho visto muito: “se o mangá não veio quando tinha anime, então não vem mais”.

  • Roses, queria agradecer por estas matérias. ^^ O próprio site eu descobri a pouco, mas foram suas matérias que chamaram minha atenção primeiro… Adorei a sua visão crítica sobre a venda de mangás… Algo que venho tentando construir a um tempo, que nem fiz com novelas, séries e comics kkk Mas mangás parece ser mais difícil, não sei se é porque é a paixão mais antiga ou se é por pouca informação que nos é disponibilizada, ou pelos dois kkkk Enfim, já acabei lendo todos os desmistificando nesses dias. Adorando as polêmicas kkk
    Mal posso esperar pelo próximo :3

  • “Existe um mito por aí de que as editoras japonesas obrigam as editoras brasileiras … a fazer de certo jeito.”

    “A editora japonesa como detentora dos direitos possui a última palavra e, é por isso, que muitas vezes as editoras brasileiras não tem outra opção que não acatar os pedidos.”

    ué!

    • 1:
      “Existe um mito por aí de que as editoras japonesas obrigam as editoras brasileiras a trazer certo título ou a fazer de certo jeito. Isso é tudo conversa fiada para boi dormir. Porém isso não quer dizer que não haja exigências, mas todas as exigências são aceitas por livre e espontânea vontade pelas editoras brasileiras (sob pressão ou não)”.

      2:
      “A editora japonesa como detentora dos direitos possui a última palavra e, é por isso, que muitas vezes as editoras brasileiras não tem outra opção que não acatar os pedidos.

      Veja que elas não são obrigadas, a editora BR pode dizer não e passar para outra. Mas se ela quer aquele título X, a editora japonesa pode ter exigências”.

      Não tirar frases de contexto, sim? ^^

      • Nada fora do contexto, só lógica:
        Assim como vc disse: “elas não são obrigadas, a editora BR pode dizer não e passar para outra. Mas se ela quer aquele título X, a editora japonesa pode ter exigências”.
        Lógicamente se a editora japonesa TEM exigencias, as BR SÃO obrigadas a partir do momento que acataram!

        • heindallbr

          concordo contigo, ficou meio sem lógica esse texto. É meio q lógico para mim que ninguém pode te obrigar a nada, mas se para publicar algo eles exigem algo isso passa a ser uma “obrigação” no sentido de que vc quer publicar aquilo e como existe concorrência vc não vai sair desistindo de tudo.

    • Roses

      STX, Obrigar e exigir é diferente. Obrigação independe da vontade da editora. Exemplo: A Kodansha obrigou a NewPOP a licenciar Ajin, a NewPOP não quer, mas foi obrigada por lei (?). >>Isso não existe.<<

      Agora exigir. A NewPOP QUER Ajin, a Kodansha só vai dar se fizer x, y e z. A NewPOP não tem outra alternativa se não acatar o que a Kodansha pede para adquirir o que ela QUER. Vê? 🙂

      A partir do momento que a NewPOP acata uma exigência e e assina, vira uma obrigação contratual. Mas a editora não foi obrigada a aceitar a obrigação contratual. Foi um acordo mútuo e aceito por ambos.

      • por isso eu demarquei o “… a fazer de certo jeito.”, não me referi a lançar manga ou não, mas sim a exatamente esse termo que contradiz com o outro demarcado.

        • Roses

          Mas o ponto está no verbo, meu caro. A sacada aí é a diferença entre “obrigar” e “exigir” para se fazer um contrato. Os japoneses não podem obrigar uma editora a trazer um título ou a fazê-lo de uma x forma. Eles podem é dizer “só vai rolar se for assim” e a editora pode olhar pra cara dela e dizer que não tem interesse dessa forma. Se fosse “obrigação”, a editora não teria escolha. Como é uma exigência para ocorrer o licenciamento, a editora BR é quem decide se aceita ou não. Se topa ou não. Mas imagina que eles exijam que seja feito com luxo e tal e a JBC simplesmente “sabe” que isso não vai vender? Ela diz então que não tem interesse e passa para outra editora/obra.

          Ou seja, não é só para lançar mangá ou não, é para tudo. A editora japonesa pode pedir, por exemplo que a editora br doe 10% de toda a arrecadação para ajudar na luta contra a Aids. Duvido que tenha um contrato assim, mas contratos são acordos e pode rolar QUALQUER COISA. Mas tudo, absolutamente tudo nesse contrato só vai virar “obrigação contratual” quando, por livre e espontânea vontade, a outra empresa assinar e aceitar aquilo.

          Diga-se de passagem, a empresa japonesa não é a ÚNICA com exigências. A editora brasileira também tem as suas próprias. Se uma editora japa não aceitasse o formato padrão com offset da NewPOP e exigisse que ela lançasse me papel jornal, você acha que a NewPOP aceitaria? Contratos são exigências de ambos os lados. Seria adequado dizer que a “NewPOP obriga as editoras japonesas a aceitarem lançamentos em offset”?

        • “Os japoneses não podem obrigar uma editora a … fazê-lo de uma x forma.”
          Mas é esse o ponto! SE a editora BR aceitou a exigencia de fazer de uma x forma pós assinatura de contrato, aquela exigencia passa a ser sim obrigação da editora BR, ou seja, ela É obrigada, o ponto é que não tô questionando o obvio que a editora japa não pode obrigar uma br sem nenhum contrato, mas sim o fato de que uma exigencia pós contrato É obrigação, independente mesmo se for o oposto, se for uma exigencia BR para com os japas, o fato é que a exigencia se torna obrigação de ambas as partes e que formatos podem sim serem impostos por editoras japas e ao ponto que se as brs aceitam, tornam-se obrigação.

        • Roses

          STX, “obrigação contratual” é diferente de dizer que a editora é obrigada a fazer coisas. Existem várias obrigações contratuais, como datas de lançamentos, valor de royalties, datas em que se deve enviar os dados e volumes de venda. Mas a editora não foi OBRIGADA a aceitar aquelas obrigações contratuais, ela ACEITOU as exigências e uma vez tento aceitado ela assinou um contrato garantindo que o faria, logo se tornando obrigação. São dois assuntos totalmente diferentes.

          Em todo caso a pergunta é “os japoneses podem obrigar as editoras?”, a resposta é não. As obrigações contratuais não vêm dos japoneses, bem da própria editora. Algo vira obrigação contratual quando a editora brasileira assina e “promete” fazer aquilo. Quem cria a obrigação é a assinatura da própria editora brasileira.

          Se você compra algo em 10 parcelas, é a empresa que te obrigou a fazer isso ou é uma obrigação que você assumiu? A Americanas te obrigou a comprar uma TV em 10 parcelas ou você assumiu a obrigação de comprar a TV em 10 parcelas? A Americanas pode te obrigar a comprar uma TV em 10 parcelas?

  • JMB

    Ótimo artigo!!
    Desconfio que muitos títulos da JBC foram lançados baseados nessas obrigações: ela queria certo título, mas pra ter sua licença foi preciso levar mais duas no “pacote”.
    Roses, uma pergunta (meio fora de contexto): se uma editora lança mangá X, e depois de, sei lá, dois anos ela resolver reimprimir as primeiras edições desse mangá, ela precisa pagar de novo ao licenciante? Ou por já ter licenciado aquelas edições anteriormente ela pode imprimir quantas vezes quiser, sem pagar nada a mais por isso? (Se vc já falou desse assunto, desculpa perguntar)

    • Roses

      JMB, precisa, assumindo que no contrato inicial isso não foi previsto. Mas uma nova tiragem, versão, etc, precisa de contrato novo. Inclusive contratos tem vencimento e validade. Pode ser necessário começar literalmente do zero.

      • JMB

        Agora sim essa dúvida foi sanada. Muito obrigado por responder!!

        • Roses

          Mas, uma coisa, não se “paga” nada para as licenciantes, um valor fixo. É tudo na base dos royalties, que são porcentagens na venda. Independente de tiragem nova ou não, qualquer volume paga royalties. Se o contrato não previa reimpressões, se faz uma renovação ou ajustes no contrato para poder acontecer. Casos do zero são mais coisas como lançamento de Rurouni Kenshin, algo muito antigo.

Comments are closed.

Descubra mais sobre Biblioteca Brasileira de Mangás

Assine agora mesmo para continuar lendo e ter acesso ao arquivo completo.

Continue reading