Resenha: Tanya the Evil (volume 1)

Desafiando Deus em um novo mundo…

Obras em que um personagem acaba indo parar em outro mundo se tornaram um lugar comum extensamente explorado nos últimos anos na esfera otaku e Youjo Senki (algo como “Crônicas de guerra de uma meninha”, segundo a Wikipedia) é mais uma dessas obras. No caso, o protagonista da história morre e Deus decide castigá-lo mandando-o a um mundo paralelo em que ele renasce como uma garotinha e que agora terá que fazer de tudo para sobreviver, sob o nome de Tanya.

Youjo Senki surgiu como uma série de light novels de autoria de Carlo Zen, tendo sido publicado de forma impressa pela primeira vez em 31 de outubro de 2013 pela editora Enterbrain, contando com ilustrações de Shinobu Shinotsuki. A obra prosseguiu muito bem, logo ganhando adaptação para mangá e para animê, em 2016 e 2017 respectivamente.

Enquanto a light novel permanece inédita no Brasil, a animação encontra-se disponível na plataforma de streaming Crunchyroll, inclusive com opção de dublagem em português. O mangá, por sua vez, começou a sair agora pela Panini.

Essa versão em quadrinhos ficou a cargo de Chika Tojo (responsável pelos desenhos de um do mangás Code Geass, Code Geass – Oz the Reflection, ainda inédito no Brasil) e permanece em publicação por lá, atualmente com 14 volumes. Por aqui, a obra foi anunciada em dezembro pela editora Panini e começou a ser lançada há algumas semanas. Lemos o primeiro volume e viemos falar um pouco mais sobre esse título para vocês…

  • Sinopse Oficial

Na guerra, uma jovem de cabelos loiros, olhos azuis e pele branca, quase transparente, luta na linha de frente. Ao mesmo tempo em que comanda o exército, ataca impiedosamente seus inimigos pairando pelo ar. Ela costumava ser um assalariado em um escritório de elite do Japão mas renasceu como uma garotinha por causa de um deus colérico. Seu nome é Tanya Degurechov e, priorizando a otimização e o avanço acima de tudo, ela se tornará a entidade mais perigosa dentre os feiticeiros do Exército Imperial.

  • História e Desenvolvimento

Primeiras décadas do século XX. O mundo não é a Terra que conhecemos e sim uma outra realidade em que magia existe e a tecnologia ainda não está tão avançada. As ânsias imperialistas, porém, também estão presentes nesse mundo e uma guerra está acontecendo. A principal força e a quem acompanhamos de perto é o Império, a quem Tanya Degurechov, uma garotinha de apenas nove anos, serve como uma feiticeira do exército.

Tanya, na verdade, era um homem japonês que vivia em nosso mundo e, em seu trabalho, costumava ser o responsável por demitir pessoas. Um dia, no entanto, um dos ex-funcionários o jogou nos trilhos do trem e ele acabou indo se encontrar com Deus, literalmente. O homem é totalmente sem fé e Deus decide fazê-lo renascer em um mundo diferente (sem tanta ciência como é o mundo atual) e como uma meninha para que ela aprenda a acreditar e adorar O criador. Agora chamando-se Tanya, tudo o que ele queria era viver tranquilamente, em paz, longe das linhas de frente, porém o destino e suas atitudes fazem com que seus planos não deem tão certo assim e ele acaba sempre em batalhas que não desejaria.

Esse background pode nos levar a ter uma visão um tanto quanto errada sobre a obra, nos fazendo crer ser só mais um título genérico de um personagem enviado para outro mundo, ou que colocaram uma garota como protagonista como forma de fetichização. Não poderia estar mais errado. A obra, na verdade, é um grande compêndio sobre guerra, mostrando estratégias militares e evocando diversos aspectos da história de nosso mundo.

Na grande maioria dessas obras de protagonistas em outro mundo, os lugares-comuns se repetem à exaustão e cansam muito se um autor não consegue executar bem. Por exemplo, muitos protagonistas são otakus reclusos com poucos ou nenhum amigo e no mundo novo vários deles estarão envoltos em um “harém”, com várias garotas por perto. De igual modo, a ambientação de jogos está presente em várias dessas obras, sejam aquelas em que os personagens ficam presos dentro de um deles, sejam aquelas que se utilizam daquele esquema básico de missões e coisas do tipo. Na superfície várias dessas obras parecerá muito diferente uma da outra para a maioria das pessoas, mas na estrutura profunda são bem semelhantes, mesmo aquelas que buscam subverter as expectativas, como Konosuba! e Re: Zero.

O protagonista antes de ser Tanya

Tanya the Evil é o completo oposto disso. O protagonista já é diferente por ser um homem adulto (coisa um tanto quanto rara nessas obras) e não ter vícios otakus, sendo também bem pragmático e frio. Pode não ter amigos (na verdade, não sabemos, já que pouca coisa é dita no mangá e no animê), mas parece ser um exímio estudioso e conhecedor amplo da cultura militar, não apenas a nipônica. Outro aspecto muito interessante é que seu renascimento em outro mundo não se dá abruptamente, ele não é simplesmente transformado em uma menina, ele nasce de novo, começando como um bebê recém-nascido, ainda que guarde as memórias de seu mundo antigo.

Além disso, enquanto transformado em uma menininha, Tanya não é usada para fetiche e sexualização, o que mais ainda distância essa obra de vários outros títulos de personagens que vão parar em outro mundo. Sem dúvida, esses são detalhes que saltam aos olhos e nos mostram que ali tem coisa interessante e muito boa. Não que as outras obras não sejam, mas quando você se depara com algo verdadeiramente diferente, você tende a ver mais defeitos (ou antes, menos qualidades) nas obras que ama.

O que mais chama atenção em Tanya the Evil é que a protagonista é mostrada realmente como uma criança (as pessoas veem isso), mas ao mesmo tempo compreendem o pensamento avançado para alguém de tão tenra idade. Tanya sabe muito bem o que fazer e quando fazer em uma guerra. Por guardar as memórias de sua outra vida, a personagem relembra bem tudo o que estudou e nos apresenta diversas passagens interessantes sobre os conflitos em nosso mundo (inclusive passagens poucos exploradas nos livros de história), sempre os usando para buscar soluções ou entender os objetivos em uma determinada batalha.

É bastante interessante o modo como o autor utiliza-se desses conflitos, sempre evocando as contendas ocidentais. Usualmente, obras que tratam de guerra costumam se valer da história japonesa ou que tiveram participação do Japão e apenas isso, mas Tanya the  Evil, por se passar em um mundo que evoca a Europa do início do século XX, foge completamente desse lugar comum. O conhecimento de cultura cristã ocidental também é um ponto alto do mangá, mostrando um Deus que aos olhos do protagonista seria o cristão. Carlo Zen, criador da obra original, parece ter um conhecimento muito grande sobre os aspectos militares e a história ocidental, um ponto mais do que favorável e que faz a obra ser mais universal.

O desenvolvimento do mangá é bem gradual, mostrando o conflito de Tanya com Deus, o ódio dela para com sua situação e o desejo de viver uma vida sossegada e em paz. Em mais de uma oportunidade ela tenta mostrar que quer estar na retaguarda, mas inevitavelmente acaba nas linhas frente, arriscando sua vida.

Infelizmente o volume inicial ainda não mostra toda a maestria e vilania de Tanya (que lhe rendeu o apelido de Loli Nazista nos recantos da Internet). Apesar de vermos as expressões faciais da personagem, elas ainda são menos contundentes que a versão animada. De igual modo, as estratégia militares ainda não foram totalmente apresentadas e o volume um parece meio parado, apesar de várias coisas acontecerem. Além de todo o aspecto, digamos assim, inventivo, o que dá um charme a mais em Tanya the Evil é justamente a personalidade de Tanya, sua malvadez intrínseca, bem como as diversas estratégias de combate e ambas as coisas pouco tivemos no volume 1. Não quer dizer que não há, mas foi muito pouco e a gente desejava um algo mais.

De modo geral, o mangá Tanya the Evil ainda precisa melhorar um pouco mais para ter um status de grande obra e de boa adaptação. Ele apresenta alguns pontos positivos, como um humor bem engraçadinho em algumas expressões da protagonista, mas ainda não mostrou totalmente a que veio. Os próximos volumes demonstrarão se há evolução ou não.

Portanto, Tanya the Evil, é um quadrinho que fica na média, não apresentando aquela coisa que nos faz gritar o quão magnifica é a obra, mas também não sendo algo completamente dispensável e esquecível. E só de já não ser esquecível, esse mangá já consegue ser bem melhor do que outras adaptações de light novels (sim, estamos olhando para você, quadrinho sem graça de Re: Zero).

  • A edição nacional

A versão brasileira do mangá veio no formato 13,7 x 20 cm (padrão da Panini), com miolo em papel offwhite e algumas páginas coloridas, no mesmo papel, ao preço de R$ 21,90. De modo geral, é uma edição bem feita, sem problemas de encadernação, daquelas bem maleáveis que permite a obra ser folheada e lida sem problemas.

Um detalhe que chama a atenção é a total ausência de sinopse na parte de trás do mangá. Acaba sendo um demérito, pois isso é algo bastante necessário para instigar ainda mais a curiosidade daqueles que não conhecem a obra.

Ainda nos aspectos visuais outro detalhe importante são as capas internas do mangá que são, nitidamente, capas também^^. Tanya the Evil era um mangá que precisava ser lançado com sobrecapa para que essa segunda capa fosse uma capa de fato e não algo interno. Esse não é um ponto que a gente usualmente comentaria, mas dado que a Panini começou a lançar mangás com sobrecapa, realmente não deu para entender o porquê de Tanya não ser um deles, sendo que essa segunda capa é bem bonita, lembrando livros clássicos.

Em termos de texto, ele está muito bem adaptado, com uma leitura bastante fluída e sem nenhum gargalo linguístico. Também não encontrei erros de revisão, então o trabalho da editora foi bastante competente nesse aspecto.

  • Conclusão

Existe uma regra não escrita que quando se trata de uma adaptação de light novel, o mangá é sempre o pior meio para você ter contato com uma obra. O ideal é você ler os livros originais ou na falta disso, ver a adaptação em animê. Não é uma regra imutável, mas costumeiramente é assim que costuma ser. Tanya the Evil não foge a ela

Mesmo a gente não tendo lido a série de livros originais, é bem claro que a adaptação em mangá é algo aquém da versão animada, não conseguindo manter o nível elevado do animê e precisando mostrar um pouco mais a que veio. Ainda assim, o mangá consegue respirar muito bem por si só e nos apresenta uma história bem concisa e desenvolvida, de modo que é possível apreciar uma boa narrativa por meio dos quadrinhos.

Não é tão bom quanto o animê, provavelmente fica muito distante dos livros originais, mas mesmo assim o mangá Tanya the Evil é uma obra bem interessante de acompanhar. Não é a melhor, nem a pior das histórias em quadrinhos japonesas, é apenas uma mediana, mas uma mediana boa e que vale a pena dar uma olhada, principalmente se você gosta de histórias de guerra.

  • Ficha Técnica

TítuloCrônicas de Guerra: Tanya the Evil
Autor: Carlo Zen; Chika Tojo
Tradutor: Erika Abreu
Editora: Panini
Dimensões: 13,7 x 20 cm
Miolo: Papel Off White
Acabamento: Capa cartonada simples
Classificação indicativa: 16 anos
Número de volumes no Japão: 14 (ainda em publicação)
Número de volumes lançados: 1 (ainda em publicação)
Preço: R$ 21,90
Onde comprarAmazon / Americanas

4 Comments

  • JackVON

    Kyon, no Twitter do Senpai TV, falaram que iriam anunciar mais dois mangas da Panini, e escreveramo seguinte :

    “Amanhã a Panini vai anunciar dois mangás novos no Senpai TV!

    O outro título é continuação de um mangá já publicado no Brasil, mesclando romance e criaturas da noite… Já descobriu qual é? Não perca amanhã às 20 horas na Rede Brasil de Televisão e às 21 horas no YouTube”

    Alguma noção do que poderia ser ?

Comments are closed.

Descubra mais sobre Biblioteca Brasileira de Mangás

Assine agora mesmo para continuar lendo e ter acesso ao arquivo completo.

Continue reading