Biblioteca Brasileira de Mangás

“Rosa de Versalhes” e uma mudança de visão…

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Os reis eram tiranos ou não?

ATENÇÃO: O TEXTO A SEGUIR TERÁ SPOILERS

No último mês de julho, a editora JBC publicou o quinto e último volume do mangá Rosa de Versalhes, de Riyoko Ikeda. Clássico dos mangás shoujos, a obra é um tanto quanto diferente dos títulos que costumam ser publicados no Brasil, pois é de caráter histórico e se passa na França. Ele é um daqueles títulos super importantes, que influenciou diversas obras que vieram posteriormente e ainda hoje é lembrado e relembrado pelas novas gerações.

Demorou anos para sair no Brasil, mas foi anunciado pela JBC em 2018 e começou a sair em fevereiro de 2019. Originalmente completo em 10 volumes, a edição brasileira diminuiu os dez tomos para apenas cinco, seguindo uma edição japonesa que foi lançada em 1994, que contava com comentários de diversas personalidades.

A história acompanha Oscar, Maria Antonieta e Fersen, na época que se inicia anos antes da Revolução Francesa e se estende até lá. Oscar é uma mulher que foi criada por seu pai para lhe suceder e ela acaba fazendo parte da Guarda da Rainha. Maria Antonieta é a famosa rainha da França de origem austríaca e Fersen é um conde sueco que vem a ter um relacionamento com a rainha. Há ainda diversos outros personagens, como André, amigo de infância de Oscar, e Rosalie, uma jovem que tem origem humilde, mas cujo nascimento guarda um grande segredo.

A obra se desenvolve ao longos dos anos, com uma reunião de  intrigas, pessoas querendo se dar bem às custas dos outros, tramando planos para enriquecer (desde assassinatos a golpes), e claro um intenso drama humano que se mostra tanto no pessoal (o amor, por exemplo), quando no social (a pobreza crescente, o descontentamento com o governo, etc). É um mangá intenso e belo que além de tudo isso discute questões de gênero, mostrando que o seu sexo não define quais profissões você deve seguir em sua vida, bem como o modo de se vestir não define quem você.

Eu já conhecia Rosa de Versalhes por meio de seu animê (ou antes por meio daquele filme compilação que foi lançado no Brasil) e já tinha lido uma parte do mangá, mas a leitura da versão da JBC foi minha primeira experiência completa. O que eu vi do animê termina antes de muitas coisas, com a morte de Oscar pouco antes da tomada da Bastilha. Não vemos o rei e tampouco a  rainha serem guilhotinados. Então o volume final inteiro foi inédito para mim. Na verdade, boa parte de antes também havia sido inédito (afinal o filme compilação corta muitas coisas) e eu só conhecia os acontecimentos básicos, como a cegueira e posterior morte do André, bem como a de Oscar, já citada.

Mas, para além de tudo de bom que é a história de Rosa de Versalhes, uma das coisas que eu mais achei interessante nessa obra é como o rei e a rainha da França são mostrados como pessoas humanas, de carne e osso, com seus hobbies, sua alegrias, além de todos os sofrimentos e amarguras (é desolador quando a gente vê eles sem dinheiro até para mandar fazer o funeral do filho). Claro que eles são nobres e têm pensamentos de superioridade vez ou outra, porém a leitura dessa obra de ficção abre muito mais os nossos olhos para esse período da história da França, que muitas vezes é apenas passado de forma rápida na escola*, sem se aprofundar nessas figuras históricas importantes.

A gente conhece o que antecede à Revolução Francesa. A corte começa a gastar demais, a dívida se torna enorme, os impostos aumentam, a população vive em extrema pobreza, etc, etc. Entretanto, nada era mudado e chegou um momento em que tudo explodiu. Isso é algo básico que se aprende na escola, mas nela a gente não tem muita noção de várias questões, como, por exemplo, o porquê de ninguém ter tomado coragem de acabar com a gastança desenfreada, de ninguém ter percebido a situação que estava indo a coroa, dentre diversas outras coisas. Isso é algo que passa batido nas aulas (ou apenas é resumido para a velha questões dos ricos não quererem perder privilégios), raramente questionamos e logo tudo corria para os próximos desdobramentos. A leitura do mangá nos mostra mais as intrigas, os alertas e os motivos pelos quais as coisas aconteceram, a vontade de mudar e as resistências quanto a isso.

A escola é muito simplista e a gente termina por ver o rei e a rainha apenas como vilões malvados que mereceram serem condenados à morte. No mangá, desde o início e com o passar dos volumes, a gente não considera reais motivos para que os dois perdessem a cabeça. Luis XVI era mostrado como uma pessoa boa, com hobbies até simples como fazer cadeados, e que não tinha pensamentos mesquinhos em relação ao povo. Maria Antonieta, de igual modo, era uma pessoa nitidamente boa, apesar de um pouco avoada em relação aos gastos da realeza por um bom tempo.

Essa é uma daquelas muitas questões chave nas discussões sobre a pena de morte (ou mesmo de todo o sistema penal), pois muitas vezes crimes menores terminam por terem penas desproporcionais, que podem ser consideradas totalmente injustas. Lógico que analisando de forma mais crítica e menos parcial, a gente vê que os governantes da França – com seus gastos desenfreados – foram responsáveis pela morte de diversas e diversas pessoas, pela fome, por doenças, entre diversas outras coisas. Só que há de se dizer que isso não era exclusivo do Rei e da Rainha, havendo todo um sistema de privilégios para os nobres, dos quais não queriam abrir mão. A pena capital para quem já não iria governar é algo bem cruel e parece mais ter efeito simbólico para a revolução do que qualquer coisa.

Pelo que pude pesquisar, existem historiadores que vem a figura de Maria Antonieta fora da pecha vilanesca e o número de biografias e trabalhos sobre ela é até assustador. Ainda não tive tempo (R$) de ir atrás de algum desses livros, mas se tornou algo de meu interesse e em algum momento pretendo me aprofundar no assunto.

Vale dizer, por fim, que, obviamente, eu não sou historiador. Eu adoro história, mas não tenho tantos conhecimentos a  respeito dessa época, então peço desculpas aos que se dedicam árdua e seriamente ao estudo da matéria por qualquer fala equivocada que eu tenha dito aqui. O ponto que a gente quis destacar neste texto, porém, é que realmente Rosa de Versalhes nos faz ver o rei e a rainha da França de maneira mais humana do que eu via na época da escola e nos fez questionar mais as decisões e os acontecimentos da Revolução Francesa. Havia muitas mentiras, muitos mal entendidos (o julgamento de Maria Antonieta deixa isso bem claro) e tudo pareceu forçado demais para que ela fosse um símbolo do passado que acabou ou um bode expiatório para o momento de revolução.

Em outras palavras, Rosa de Versalhes nos fez querer aprender mais a história dessa época da França, uma época importante para toda a humanidade.

*Eu não sei como vocês estudaram Revolução Francesa na escola. O que eu comentei aqui foi basicamente a minha experiência com o tema. Eu sempre fui aluno de escola pública – uma daquelas bem ruinzinhas – e nela esse assunto nunca foi passado de forma aprofundada para mim. Eu conhecia os acontecimentos, o que ela geraria posteriormente, mas nada muito além. 

TítuloRosa de Versalhes
Autor: Riyoko Ikeda
Tradutor: Karen Kazumi Hayashida
Editora: JBC
Dimensões: 13,2 X 20 cm
Miolo: Papel Lux Cream
Acabamento: Capa cartonada simples, com capas internas coloridas
Classificação indicativa: 14 anos
Número de volumes no Japão: 5
Número de volumes no Brasil: 5
Preço: R$ 43,90
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