Biblioteca Brasileira de Mangás

Desmistificando: O que acontece com os mangás não vendidos?

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LivrariaAs estratégias das editoras para lidar com as sobras…

É meio óbvio que nem todos os exemplares de um mangá serão vendidos, mas você já imaginou o que as editoras fazem com os não vendidos? E o que acontece se um certo título vender muito mal?

Neste desmistificando vamos comentar sobre algumas práticas e estratégias de como lidar com os mangás que não foram vendidos. Alguns desses processos acontecerão com todos os mangás, desde que eles não esgotem, outros acontecerão apenas com os que vendem muito mal. Aproveitarei e também comentarei sobre as consequências sobre a obra no caso de má vendagem.

Vale a pena ressaltar que não se tratam de regras, mas estratégias e processos que podem ou não ser utilizados pelas empresas e editoras e vão depender de n fatores.

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Vamos lá! Um belo dia vocês juntaram seu dinheiro suado, abriram uma editora de fundo de quintal e decidiram licenciar JoJo. Depois de imprimir uma quantidade exorbitante, mandaram os volumes para todas as bancas do país.

I. Recolhimento das bancas

Após um tempo x nas bancas chega a hora de recolher o que não vendeu. A distribuidora (que é a Dinap) vai passar em todas as bancas e recolher com seus caminhões e vans os volumes não vendidos. Aí temos dois cenários possíveis:

Vendeu muito bem, bem ou um mínimo aceitável. Se nosso Jojo vendeu e se pagou, a distribuidora vai recolher o pouco que sobrou e fazer o processo contrário da distribuição, juntando e recolhendo tudo até chegar na editora, que recebe essa sobra, ou estocando e redistribuindo para outras áreas e casas comerciais.

Vendeu muito, mas muito mal. Ok, Jojo não vende nada, vendeu 5 volumes para aqueles 5 que sempre pedem nas páginas das editoras. E vendeu tão mal que o preço de recolhimento e transporte de tudo aquilo é mais caro que o lucro da distribuidora. Ou seja, encalhe. E agora?

A depender do contrato com a distribuidora, ela tem o direito de reciclar parte dessas obras que não venderam e pagar uma certa porcentagem do preço de capa. Basicamente é mais barato destruir e pagar essa porcentagem que mover todo aquele montante de volta.

Além da reciclagem, as obras podem simplesmente serem armazenadas ou direcionadas para outros fins e mercados secundários. No fim das contas um certo montante ainda pode ser (geralmente é) devolvido às editoras.

Esses processos fazem parte da Logística Reversa de Distribuição e é parte integrante da Logística de Venda da editora.


II. Lidando com as sobras

Chegando no seu fundo de quintal está na hora de lidar com as sobras, que podem ser estocadas, vendidas para lojas especializadas, redistribuídas, vendidas em eventos, etc. O normal é que esse resto vai sendo vendido aos poucos até esgotar (quando pode ou não ser reimpresso).

Caso a venda não tenha pagado os custos, a editora vai ter que vender mais agressivamente, oferecendo descontos para recuperar o dinheiro investido e pagar as contas. Ela pode tentar redistribuir, oferecer preços muito abaixo do normal para lojas e livrarias, tentar fazer boxes e redistribuí-los, oferecer descontos absurdos em eventos, etc. (Sim, o que a Conrad fez na sua época de crise.)

Assumindo que não tenha sido um total fracasso, esses restos podem ser armazenados por bastante tempo, inclusive num futuro podem até ser redistribuídos antes da continuação da série, na tentativa de criar novos leitores.

Basta dar uma olhada nas lojas virtuais e das editoras, fácil identificar séries completas ainda à venda depois de mais de 5 anos desde sua publicação. Embora às vezes isso seja devido à reimpressão.

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Vale a pena comentar que com outras revistas e periódicos é comum se vender ou exportar uma parte para outros países que falam português ou até nas fronteiras do portunhol. Só que nos casos dos mangás e quadrinhos licenciados isso é ilegal. As editoras só podem vender oficialmente aqueles materiais no Brasil, a venda e importação é feito por terceiros.

Assim como existem lojas no Brasil que importam produtos japoneses, existem lojas nesses países que importam produtos e mangás brasileiros. E é assim que chega mangá BR em Portugal e outros países. Por esse motivo, a venda para outros mercados não é uma saída legal (de legalidade) para lidar com o encalhe.

A caráter de curiosidade, nos Estados Unidos é diferente, as empresas já compram licenças para venda em várias nacionalidades, o mangá americano pode ser legalmente vendido na Inglaterra e Canadá, por exemplo.


III. Consequências do fracasso de vendas

Como já dito anteriormente a má venda traz consigo consequências:

Mudança de periodicidade. Obras que vendem menos podem ter periodicidades mais espaçadas para dar mais tempo de vender os volumes.

Paralisamento por tempo indefinido. Obras são paralisadas até a resolução do problema ou simplesmente esquecida e cancelada na surdina.

Cancelamento. A coisa não tem salvação, cancela-se, paga-se a multa e era uma vez. Geralmente a última opção da editora, pois não só cria uma falta de confiança do público consumidor, como pega mal com a editora japonesa. Afinal as editoras brasileiras prometem vendas e lucros às japonesas.

Mudança no tamanho da tiragem. As tiragens são alteradas para se adaptar à quantidade de venda e diminuir os prejuízos. Por isso que títulos que admitidamente venderam mal acabam esgotando rápido nas lojas.

Dá para perceber como não vender custa caríssimo para a editora? Não só tem que pagar multas e custos de retorno, como ainda é forçada a vender seu produto barato na expectativa de conseguir recuperar parte dos custos.

No fundo as lojas e a distribuidora ganham a porcentagem delas, quem assume todo risco é a editora. É ela quem vai arcar com o fracasso das vendas sozinha e ainda é forçada a pagar e restituir todo mundo da cadeia de vendas.


IV. Cancelamento

Falar de cancelamento é sempre complicado, pelos olhos de um consumidor, essa estratégia é uma afronta, ainda mais quando se trata de uma coleção longa.

Mas olhando pelo lado de uma editora, mesmo que tenha sido culpa dela (a falta de marketing, má organização, estratégias problemáticas…) o cancelamento não é algo indolor e ela é “castigada” pelos seus erros tanto quanto o leitor.

No fundo, eu pessoalmente diria que se tem que cancelar, bem, então cancele, mas que dê satisfação ao público, explique e assegure seu leitor das razões. Agora, cancelar e jamais se pronunciar, deixando os leitores a ver navios, esperando que apenas esqueçam, difícil defender uma prática assim.


Desmistificando é uma coluna semanal, lançada nas quintas-feiras, sobre o mercado e mangás brasileiros e internacionais. Você pode ver todas as outras postagens anteriores desta coluna aqui. Sugestões e comentários também são sempre bem-vindos! 🙂

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