Quem é o morto?
Quando o Crunchyroll chegou ao Brasil, os dois primeiros animes que assisti no site foram Sword Art Online e Another. Enquanto o primeiro era um tipo de história que parecia interessante a priori, o segundo era uma obra que não me interessaria de jeito nenhum. Mas dei uma chance e acabei fascinado pela história, sei lá por qual razão. Como sempre fazia na época procurava opiniões sobre o animê em sites e blogs e mesmo criticas negativas, como a do Video Quest, me faziam ver mais pontos positivos na obra.
Hoje eu enxergo que eu era muito imaturo e percebo que o animê não era uma Brastemp. O mangá tem muito mais qualidades que o animê e o livro original é muito superior às suas duas adaptações. Hoje viemos aqui falar justamente do livro original de Yukito Ayatsuji, lançado por aqui ano passado pela editora JBC.
Cuidado: pode haver spoilers…
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Preâmbulos
Quem é o morto? Quem se infiltrou na sala e ocasionou uma série de mortes? Another conta a história de Koichi Sakakibara, um estudante com problemas de saúde, e o mistério em torno da turma 3-3 do colégio Yomiyama do norte. Transferido fora de época por conta de uma viagem de trabalho de seu pai, Keiji acaba caindo na amaldiçoada turma 3-3 e agora enfrentará um fenômeno do qual não parece haver saída.
A turma 3-3 de 26 anos atrás sofreu um terrível trauma: um aluno de quem todos gostavam chamado Misaki morreu em um acidente e a turma teve dificuldades em aceitar essa perda. A partir de um momento, os alunos e o professor responsável começaram a fingir que Misaki não havia morrido. O gesto inocente, no entanto, teve consequências e, no fim do ano, ao tirarem uma foto com todos da turma, o Misaki – que não deveria estar lá – apareceu na foto Oo.
A partir daí a turma 3-3 se “aproximou” da morte. Quase todos anos, um aluno morto em anos anteriores se infiltra na sala e sem que ninguém perceba começa a frequentar a aula. O “outro” não sabe que está morto e ninguém à sua volta também consegue perceber que ele não deveria estar lá. Nos anos em que “tem”, a turma se torna vítima de uma tragédia e todos os meses alguém da turma, ou familiares da turma, morrem de todas as maneiras possíveis, seja de acidente, doença ou mesmo suicídio.
Ano após ano isso se repetia, mas um dia acharam uma solução que poderia evitar a tragédia: um aluno da sala deveria ser tratado como se não existisse.
Desenvolvimento
Essa é a premissa da história. Another é uma narrativa de mistério e até certo ponto de terror. Durante boa parte da obra muitas coisas vão sendo rigorosamente escondidas para criar um clima de suspense, outras são jogadas de forma muito sutil para que possamos ir montando o quebra-cabeça dos mistérios.
O primeiro grande mistério é o da existência ou não de Mei Misaki, uma garota que usa um tapa-olho e que fala de uma maneira muito enigmática. Toda a narrativa é posta para parecer que ela, na verdade, fosse um fantasma, desde sua personalidade, seu nome – que remete ao morto de 26 anos atrás – e várias outras coisas. Interessante é que sempre nessas ocasiões há um duplo sentido bem explícito que tanto pode remeter a uma causa sobrenatural, como pode possuir uma explicação lógica e racional. Como todos sabem, a Mei não era um fantasma. Ela apenas era a aluna escolhida para ser ignorada pelas pessoas.
O segundo grande mistério surge na parte final do livro, a pergunta sempre repetida “quem é o morto?”. Saber quem era o morto não significaria nada, mas em um certo momento eles descobrem que existe um jeito de parar a tragédia. E o único jeito é matar o morto, conforme acontecera anos antes com uma outra turma. E aqui vem o ponto mais importante da qualidade do livro. Diferentemente de suas versões em mangá e animê o perfil do morto é muito mais bem detalhado. Na ocasião em que alguém descobriu como acabar com a tragédia, há uma descrição das características comportamentais do morto e essas características podem ser vistas também no “morto atual”, o que torna todo o desenvolvimento do livro muito bom nesse sentido.
Outros pontos que as adaptações (mangá e animê) colocavam muito por cima também são bem mais detalhadas na obra original. O medo de Sakakibara em relação ao modo como os alunos de sua nova escola lhe tratariam por causa de seu nome, por exemplo, é bastante antecipado. No mangá e no animê, essa questão é praticamente jogada quando Mei toca no assunto, mas no livro o rapaz já fala de seu receio bem antes dessa conversa com a Mei.
Talvez o que torne o livro com mais qualidade, na verdade, é o fato de que nele Koichi Sakakibara possui uma personalidade bem mais definida. Enquanto nas adaptações, Koichi é só um jovem querendo descobrir um mistério, no livro nós vemos atitudes que o distinguem, pensamentos, ações, entre outros.O desenvolvimento do livro é realmente muito bom e sentimos um grande prazer lendo a história, vendo os mistérios, as coisas sendo jogadas despretensiosamente, etc…
Nem tudo são flores
Obviamente, o livro possui seus defeitos. Talvez por ter sido serializado, talvez por falta de maturidade do autor, há um excesso de repetições e explicações desnecessárias. Não raras vezes, o narrador-protagonista Koichi Sakakibara rememora coisas que aconteceram pouquíssimos capítulos antes e a nós, leitores, fica parecendo realmente que somos idiotas.
Mas o problema principal são as explicações desnecessárias. O autor parece tratar o leitor como uma pessoa incapaz de desvendar os mistérios por si mesmos. O cúmulo ocorre no final do livro quando a identidade do “outro”, do morto, é revelada. O autor acaba por citar todas as pistas que ele deixou ao longo do livro – pistas muito perceptíveis, aliás – somente para que ficasse claro ao leitor que todo o desfecho já estava previsto desde o início. Para um livro, essa é uma estratégia bastante imatura. Não fosse essas coisas, o livro seria muito melhor…
A edição brasileira
A edição brasileira foi feita em papel offset, possui orelhas e hot stamping na capa. Another é um livro como qualquer outro e, nesse sentido, a edição nacional está boa e com uma capa muito bonita. Contudo, a edição peca por diversos erros de revisão, dos mais variados possíveis, como os seguintes:
Falta de espaço entre as palavras: envolvidoneles (pág 336); caino(pag 367)
Inversão de sílabas: “descolada” em vez de “deslocada” (pág 73)
Troca de letras: “Se conseguiu” em vez de “só conseguiu”; “Pêde” em vez de “Pôde” (pág 219); “deve” em vez de “teve” (pág. 272)
Ortografia: “Mereçia” em vez de “Merecia” (pag 228); “mais” em vez de “mas” (pág 99)
Inserção de palavras que não deveriam estar lá: “se virou para O mim” (pág 46); “quinta-feira DE 8 de maio (pág. 69); torceu O seus lábios (pág 266)
Inserção de letras que não existem: “cheguara” em vez de “chegara” (pág 76); “puxar conversar” em vez de “puxar conversa” (pág 138); “Meus próprios olhosF” (pág. 214); “eSxistisse” em vez de “existisse” (pág 221);
Falta de crase: “me contou a noite” (pág. 55 ); “policiais a paisana” (pág. 152)
Crase inexistente: Responda à pergunta (pág 15);
Hein? : “para cima e BARRA baixo” em vez de “para cima e para baixo” (pág. 271).
Fora esses vez ou outra há ainda erros de vírgulas, como na página 81 ( na semana passada foi, por acaso), tempo verbal, entre outros. Contudo, o pior foram erros de datas. Na página 21 cita-se que dia 26 de abril foi um domingo, mas paginas antes (18) disseram que esse dia era um sábado. Como a narrativa se passa em 1998, a citação da página 21 é a correta. Outro erro de data acontece na página 69, quando é dito que “No dia seguinte, quinta-feira de 8 de maio, não vi a Mei Misaki” (sic): e 8 de maio de 1998, na verdade era uma sexta-feira….
Sejamos sinceros: para um livro essa quantidades de erros são imperdoáveis. Ficou parecendo que a empresa – que conta com vários revisores, diga-se – não deu tanta atenção à qualidade da revisão para poder lançar “às pressas”, na CCXP do ano passado, uma pena.
Veredito Final
Mesmo com esses problemas vale a pena comprar a edição brasileira de Another? Apesar dos erros imperdoáveis, eu não me arrependi de comprar o título. A leitura é muito agradável e os erros de revisão não interferiram na minha apreciação da história. No entanto, minha crítica à falta de cuidado com a revisão permanece e, em minha opinião, só vale a pena comprar esse livro se você não é fluente em nenhum outro idioma ou não tem dinheiro suficiente para importar uma versão estrangeira. O livro de Another é bom e realmente merece uma leitura de todos os fãs da obra. Se tiver que ser a edição brasileira, que seja…
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BBM
Isso é o que acontece quando se faz as coisas na pressa.
Estava olhando uns mangás e livros numa loja hoje. Me interessei pela Novel de Another, mas queria saber mais sobre ela antes. O que li me desanimou, vou esperar mais um tempo pra ver.
Olhei, também, o mangá O cão que guarda as estrelas. Aquilo, por acaso, é feito de ouro? Como um mangá de menos de 140 páginas custa 25 reais? Aí fica complicado, né!!!!
Acabamento e tiragem menor
É, meio que desanima esses erros aí.