Resenha: Namorada de Aluguel #01

Não é aquele filme de 1987…

As revistas de mangás shonens (voltadas para o público juvenil masculino japonês) sempre tiveram um espaço para obras de conteúdo romântico, mostrando o relacionamento entre duas (ou mais) pessoas e os diversos conflitos existentes no meio disso.

A abordagem, porém, varia de obra para obra. Ela pode ser levinha e fofinha, praticamente sem romance (como One Week Friends), dramática (como Your Lie In April), yuri (Bloom Into you), erótica (Yuuna e a Pensão Assombrada) dentre diversos outros tipos e subtipos.

Um tipo que se destaca muito é o shonen de comédia romântica harém, aquele na qual o protagonista acaba sendo envolto em um séquito de mulheres que podem (ou devem) em algum momento ter um sentimento para com ele, sempre existindo diversas situações de conflito, muitas delas hilariantes. Esse é o estilo de Love Hina, As Quintuplas, We Never Learn, e de Namorada de Aluguel, obra da qual falaremos neste texto.

Namorada de Aluguel é de autoria de Reiji Miyajima e está em publicação no Japão desde 2017 nas páginas da revista Weekly Shonen Magazine, da editora Kodansha, permanecendo em andamento até hoje e somando 21 volumes publicados até o momento.

O título já é lançado em boa parte dos mercados ocidentais, tendo ganhado especial relevância após a adaptação animada (exibida entre julho e setembro de 2020), o que fez ele ser licenciado em diversos países. No Brasil, o título foi anunciado pela editora Panini no último mês de março e o lançamento do primeiro volume ocorreu em junho.

Mami, a ex-namorada do protagonista

Namorada de Aluguel conta a história de Kazuya Kinoshita, um jovem universitário de 20 anos, que tem o seu coração (e o seu ego) despedaçado após sua primeira namorada romper com ele apenas um mês após os dois começarem a sair juntos. Tenso, irritado e imaginando coisas, Kazuya descobre um site chamado Diamond em que é possível alugar mulheres (não sexualmente, importante dizer) por um certo tempo e uma moça fingirá ter um relacionamento com o cliente durante o período determinado.

No impulso, o rapaz contrata uma moça e, a partir daí, uma série de acontecimentos faz com que as coisas fiquem muito complicadas, não só para o rapaz, mas também para a moça que ele contratou…

O protagonista

Namorada de Aluguel é um mangá de comédia romântica com o foco bem determinado no humor, explorando situações-conflito o tempo todo para gerar o riso, mostrando os desejos sinceros dos personagens para contrariar eles em seguida com uma série de coincidências que só uma obra de ficção pode proporcionar.

Igualmente, a obra tenderá a reunir um espectro de garotas ao redor do protagonista, novamente para explorar situações para fazer os leitores darem risadas, muitas vezes beirando a esfera do “vergonha-alheia”.

A “namorada de aluguel”

Neste primeiro volume nós conhecemos apenas três personagens centrais, Kazuya (o protagonista), Chizuru (a namorada de aluguel) e Mami Nanami (a ex-namorada do protagonista), mostrando o relacionamento entre eles e vislumbrando um pouco de suas personalidades e da trama inicial da obra.

Basicamente, Kazuya aluga Chizuru para uma hora e se depara com uma grande atriz, com uma moça que o trata bem, é toda delicada e tenta fazer de tudo para parecer realmente uma namorada perfeita e para o encontro ser dos melhores para Kazuya. Do ponto de vista do protagonista (e também do leitor) há todo um estranhamento na situação, já que não se trata de uma conversa normal e sim de uma situação bizarra em que uma pessoa pagou para acreditar em palavras falsas, encenadas.

Mas isso é apenas o início da história. Por uma série de coincidências – uma após a outra – Kazuya e Chizuru se reencontraram e – por outra dessas coincidências – ele acabará tendo que alugar a garota toda semana durante uma hora, ao menos por um tempo, pois se não fizer isso as coisas tendem a ficar ruim para os dois (e de uma forma bem ruim mesmo).

No que toca à comédia, a obra consegue se sustentar bem, com muitas passagens bem executadas, feitas para gerar riso no rosto dos leitores, em especial com piadas relacionadas ao protagonista da história. Já em relação ao romance não temos muita coisa nesse início, com pouquíssimas passagens que “tocam” o coração, mas em geral só servem também para mover o humor, sem um algo a mais.

Falando especificamente dos personagens, se Chizuru é uma boa atriz como dissemos, sua personalidade real, porém, é bem mais dura, mais enfática, talvez ríspida, de modo que vemos ela tentando mostrar-se mais madura, mais segura de si mesma, ainda que dê para perceber as pequenas imaturidades de sua personalidade aqui e ali.

Ela gosta de seu trabalho e o faz muito bem, mas esconde isso de todos, o que é compreensível, afinal trata-se de algo mais visto e que pode dar margem para as pessoas pensarem que ela faz outras coisas.

Já quanto a Kazuya podemos dizer que ele é o nada em pessoa, de longe o pior protagonista das comédias românticas populares da atualidade. Assim como muitos protagonistas desse tipo de história (sejam obras novas, sejam antigas), ele é uma negação com mulheres, praticamente sem experiência e alvo de piadas o tempo todo, no caso dele até mesmo dos próprios familiares. Só que se com outros protagonistas a gente consegue se compadecer de suas histórias, com Kazuya a gente só consegue pensar que a situação dele é merecida.

Kazuya se mostra uma pessoa completamente imatura em diversos momentos da obra fazendo e pensando coisas que humilham mais a ele do que qualquer fala de outra pessoa. O modo como ele reage ao término com Mami é bem demonstrativo disso. Em vez de apenas sentir aquela grande tristeza que os rompimentos fazem com as pessoas, ele sente raiva e ciúmes descompensados, não naturais para alguém que diz  gostar de outra pessoa. Claro que é natural que se sinta e que se faça coisas impensadas após um rompimento (como entrar num site e alugar uma namorada), mas imaginar a ex-namorada com outro e se excitar com isso não é uma dessas coisas.

O modo como Kazuya se porta durante toda a trama deste volume parece execrável em muitos níveis. Pensando, por exemplo, nos primeiros encontros entre Kazuya e Chizuru isso se mostra mais evidente. Por mais que ele veja a estranheza da situação, ele termina por fazer uma coisa que só uma mente perturbada poderia fazer, realizar acusações sem sentido para com a garota, revelando ainda uma completa imaturidade e falta de senso de realidade.

Ainda que, durante o volume, algumas coisas ele faça em prol de um objetivo, ele não age de uma maneira correta, levando consigo outras pessoas para situações constrangedoras. É uma sequência de coisas que uma leva a outra, que leva a outra, que leva a outra, que poderiam ter sido evitadas se ele fosse uma pessoa melhor. Não obstante, ainda que algumas dessas coisas sejam feitas por causa do tal objetivo, também é claro que ele faz com outras intenções, essas bem menos nobres, e que escancaram a personalidade doentia dele.

Já sobre Mami temos pouco o que comentar, pois o “tempo de tela” dela foi bem pouco e não deu para vermos em detalhes a sua personalidade. O que sabemos é que se ela terminou com Kazuya por causa da personalidade dele, pelas coisas que ele fazia, todo mundo conseguiria entender sem o problema. Afinal, embora ele tenha 20 anos, parece agir como um adolescente de 14. Basta você abrir o mangá, na primeira página, que você já  consegue perceber isso, apenas pelas expressões do protagonista.

Em uma avaliação geral sobre esse primeiro volume, Namorada de Aluguel pode até ser uma comédia romântica boa ou que fique boa no futuro, mas o tomo inicial não dá muitas pistas disso e existe um motivo bem claro, evidente, e que fica piscando como um letreiro luminoso em uma estrada, é um motivo com nome e sobrenome, Kazuya Kinoshita.

Ele não é apenas uma negação em matéria de amor, ele é uma negação como pessoa e que dificilmente a gente conseguiria ter empatia. Mesmo que a gente pense sobre o passado dele (da qual neste primeiro volume a gente só sabe que ele nunca tinha tido uma namorada) e o que o levou a ser assim, é difícil olhar para as ações do protagonista sem um pingo de enfado para com a figura dele.

Por mais que exista humor na obra e ela nos faça rir aqui e ali, é preciso mais para nos fisgar. Em uma boa comédia romântica a gente deveria ter um mínimo de empatia para com o protagonista, criar algum tipo de laço com ele e ver suas qualidades se sobressaírem apesar dos defeitos evidentes. No mínimo, a gente deveria sentir pena com as situações hilariantes que acontecem ou “abraçarmos” o personagem por causa da falta de habilidade dele.

É assim com o Keishi Morisato, com o Keitarô, o Hideki e até mesmo com o chatíssimo e irritante Futaro (leia nossa resenha do primeiro volume de As Quintuplas, onde falamos muito mal do protagonista). Desde o primeiro volume a gente já vê esses protagonistas com algum potencial, ou sente algo positivo, de alguma maneira, apesar de tudo de ruim que eles possam ter. Mas em Namorada de Aluguel isso não acontece, em Namorada de Aluguel a gente só consegue detestar o Kazuya.

Pode ser que no decorrer da obra Kazuya se torne uma pessoa melhor? Pode ser (e é isso o que deveria ocorrer, um amadurecimento dele, é o normal e o natural de uma boa obra), mas a gente não sentiu a mínima vontade de ver como a história continua. A gente não quer saber se Mami ainda gosta do Kazuya, não quer saber se Chizuru se apaixonará por ele, não quer saber se outras meninas aparecerão, etc, etc, etc. Isso por que o protagonista não nos apeteceu em nada…

Embora existam exceções (obras conceituais, por exemplo), o normal de um primeiro volume é nos fazer conhecer a história e despertar o nosso desejo de continuar a acompanhar a obra, ver os desdobramentos, etc. Namorada de Aluguel não consegue fazer isso e o grande responsável é, como dito, o protagonista.

Então Kazuya Kinoshita é o responsável para a gente não recomendar esse mangá.

***

A edição brasileira veio no formato padrão da editora Panini (13,7 x 20 cm, miolo em papel offwhite e capa cartonada simples) e apresenta todas as qualidades e defeitos das edições mais recentes da editora, com boa maleabilidade do miolo, mas com páginas com um pouco de transparência.

O valor cobrado é o mesmo da maioria das obras da editora, R$ 29,90, não sendo barato sob nenhuma esfera que se olhe, ainda mais se comparado com obras da mesma faixa de preço e com melhor qualidade como Paradise Kiss (leia nossa resenha).

Por fim, além do protagonista, pesa contra Namorada de Aluguel o fato de a obra ainda estar em andamento (tem 21 volumes atualmente) e ser lançado em periodicidade mensal. Gastar R$ 29,90 por mês em uma obra longa e que o primeiro volume não se mostrou tão promissor, não parece mesmo uma boa ideia.

Então reafirmamos nossa des-recomendação.

Ficha Técnica

Título Original: 彼女、お借りします
TítuloNamorada de Aluguel
Autor: Reiji Miyajima
Tradutor: Erika Abreu
Editora: Panini
Número de volumes no Japão: 21 (ainda em publicação)
Número de volumes no Brasil: 1 (ainda em publicação)
Dimensões: 13,7 x 20 cm
Miolo: Papel offwhite
Acabamento: Capa cartonada simples
Classificação indicativa: 16 anos
Preço: R$ 29,90
Onde comprar: Amazon / Loja da Panini

3 Comments

  • musck29

    Nunca li nem assisti, mas morro de vontade por conta do que todos falam da obra…achei super legal essa ideia de vc criar o pior protagonista de todos os tempos!

  • Kenny

    “…mas imaginar a ex-namorada com outro e se excitar com isso não é uma dessas coisas”
    …Não? Hã, digo, err, claro, claro que não!

  • eu li esse mangá online (até o capítulo mais recente kk) e saiba que o kazuya não demonstra evolução nenhuma quanto pessoa kkk. isso é um dos motivos do porque todo mundo reclama essa obra. o autor fez personagens muito cativantes, mas nossa… o câncer dessa obra é o kazuya e você pode ver isso desde o capítulo 1

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